terça-feira, 7 de julho de 2015

Erário público e sua transparência

Em várias ocasiões, tive oportunidades em dissertar sobre este tema, seja em artigos, palestras ou cursos de capacitação de gestores, exatamente por se constituir em fator de primordial importância e determinante ao sucesso ou ao fracasso de qualquer empreendimento entre público e privado.

Na realidade, também é determinante no processo de gerenciamento e aplicação dos recursos públicos mesmo quando o ente gerenciador é tão somente a administração pública. Há um movimento contrário à adoção de modelos de gestão nos quais participam entidades de direito privado. Alegam-se perda do controle, uso desregrado do recurso público, diminuição dos serviços ofertados, etc. Mas o fato é que, a má gestão, a improbidade, a falta de qualidade e o uso irracional do dinheiro público, estão presentes em boa parte das administrações municipais, estaduais e federais. Os Tribunais de Contas e os Judiciais estão abarrotados de processos que apontam responsabilidades de toda ordem. O que sempre dizemos é: má gestão e corrupção podem acontecer em qualquer modelo, pois independem do modelo de gestão e sim do caráter dos dirigentes. 

Durante os mais de 30 anos transitando pelos dois segmentos pude constatar essa afirmação.

E aí vem a seguinte pergunta: então não há jeito?
Sim, é claro que há. 

Então Vejamos.

Na administração pública brasileira há muito se vem criando mecanismos de controle e monitoramento que impeçam ou ao menos dificultem práticas de gestão que signifiquem a ineficiência como produto, que, por conseguinte, se resume na falta de qualidade e no uso irracional dos recursos. São inúmeras leis, normas, regulamentos e acórdãos que se juntam e se entrelaçam para obrigar aos gestores que alcancem resultados com eficiência. Portanto, não é a ausência de regulamentação que faz o “mau gestor”.

Por outro lado, nem sempre o “mau gestor” está configurado por um ato de improbidade ou deliberadamente por alguma forma de corrupção. Estes são imperdoáveis e merecem a aplicação rigorosa da lei em todas as instâncias, administrativa, civil e penal quando for o caso. Esses sim são aqueles destituídos de caráter à altura para lidarem com a coisa pública. Excetuando-se, portanto, esses casos, vamos tentar entender as outras razões que levam os gestores públicos a não cumprirem eficientemente as suas missões em seus respectivos órgãos. Embora apareça como vilã, a legislação não é o maior obstáculo. Quando a estrutura do órgão aplicador da lei tem adequada capacitação, a aplicação da lei se torna mais leve. Ao contrário, tudo fica mais difícil. Por exemplo: a Lei 8.666/93, a maior das vilãs, exige que as contratações de obras e serviços sejam precedidas do respectivo projeto básico. Ora, elaborar um projeto básico exige conhecimento não somente da sua estrutura em si, mas principalmente do objeto que se pretenda contratar. E esse componente é só o começo do processo. Dele virá o edital, a publicidade, audiência pública, questionamentos prévios, abertura de propostas, recursos e contratação. Para cada fase requer conhecimento e experiência específica. O que então acontece quando não existe a estrutura e capacidade adequadas? Os instrumentos são mal elaborados, as provisões orçamentárias são precárias e as escolhas podem recair em fornecedores pouco comprometidos com a qualidade dos produtos ou com prazos de entrega. Consequência: perda da eficiência do poder público, diligência do tribunal de contas e inserção do gestor no rol dos responsáveis. Neste caso, por melhor que tenha sido a intenção do gestor, ela não será considerada, pois “boa intenção” não é fator atenuante nesses casos.

A solução, portanto, é a capacitação, a padronização, a redução do turn-over, as boas condições de trabalho e, principalmente, o planejamento. O uso de ferramentas informatizadas para pesquisas é essencial, pois tudo o que se deseja fazer, ou quase tudo, encontram-se similares já realizados, que podem servir de parâmetros.

E quais as diferenças em relação ao gerenciamento feito por entidades privadas?

Eu divido em dois grupos:

1- Flexibilidade

Consiste na forma de aplicar as regras (não se trata de ausência de regra).

Toda entidade qualificada como Organização Social e contratada para gerenciar um serviço ou uma unidade pública, firma um Contrato de Gestão, no qual são estabelecidas diretrizes e metas as serem cumpridas. A entidade não inventa nada, apenas cumpre aquilo que a administração pública determina. Um dos mandamentos previsto nos instrumentos de pactuação é que a entidade deve submeter à aprovação da administração e divulgar em diário oficial as regras para contratação de bens e serviços e a forma de contratar pessoal. Evidentemente que não se trata em aderir à Lei 8.666/93 na sua íntegra, mas também não poderá se constituir em regra destituída do mínimo que signifique a observância dos princípios constitucionais. Prevalecerá o bom senso. Parece pouco, mas, juntamente com outros fatores facilitadores fazem toda a diferença.

Quando uma entidade assina um contrato de gestão, o faz em cima de um plano de ação aprovado pela administração onde as condições de trabalho e formação de equipe são elementos cruciais no processo de assunção das responsabilidades nele contidas. Nesse ponto, entra na agenda a transparência como elemento integrador entre a entidade gerenciadora, a administração pública, os órgãos de controle e as instâncias do controle social. O interessante é que, embora a transparência seja sempre recomendável em todos os níveis e que independe das circunstâncias de governança, quase sempre as estruturas públicas não são capazes de responder adequadamente a essa necessidade.

A transparência vem de diversas formas, entre elas destaco: a prestação das contas financeiras, com os apontamentos sobre os grupos de despesas incorridas; a demonstração do nível de atingimento das metas; a movimentação dos recursos humanos; os bens e serviços contratados; os processos de contratações em andamento; o nível de qualidade percebida pelos usuários; o grau de satisfação dos colaboradores e, por fim, as notas explicativas sobre as razões do não cumprimento de metas, as dificuldades operacionais e outras informações relevantes.

Esse procedimento é peça chave no sucesso dos gerenciamentos por Organizações Sociais e se constituem nos elementos essenciais a qualquer processo de avaliação e controle, seja por parte do poder executivo quanto dos demais poderes e órgãos de controle.

2- Incorporação

O termo incorporação tem a seguinte definição: qualidade ou caráter do que é incorporado, integrado, anexado. Utilizo desse termo para registrar um dos mais importantes efeitos do processo de parceria entre a administração pública e as entidades qualificadas como Organizações Sociais. E quem são essas entidades?

São entidades de direito privado, sem fins lucrativos, criadas com a vocação de apoiar o desenvolvimento técnico-científico de segmentos que compõem as políticas públicas de interesse social. A qualificação se dá por reconhecimento da administração pública em se tornar uma entidade capaz de firmar parceria com o poder público e assim contribuir para ampliar a capacidade do estado na execução das políticas públicas, seja na área da saúde, da educação, do desporto ou da cultura. O que, porém é mais importante é justamente a capacidade dessa entidade em incorporar tudo aquilo que lhe é próprio por vocação. Isso quer dizer: se a entidade tem experiência em gerenciar ações de saúde, significa dizer que toda a sua expertise técnica e de gestão será coloca à disposição da administração pública. Mais do que isso, a administração pública irá se apropriar desse conhecimento e transformá-lo em melhores serviços à sociedade.

Esses dois pontos fecham o circuito das “boas práticas de gestão” e fomentam a transformação do círculo vicioso da administração pública em círculo virtuoso, onde os resultados obtidos beneficiam diretamente a população.

Sergio Mansilha

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